segunda-feira, 20 de junho de 2011

A luta pela legalização da maconha – a classe média sofre


            Está de volta, e com muita força, a pressão pela legalização da maconha. Debates legislativos, decisões judiciárias e mesmo declarações do ex-presidente FHC apimentaram a volta do tema. Porém, se há quatro décadas essa discussão estava no fronte da quebra de importantes paradigmas culturais, hoje parece mais uma denúncia do típico “engajamento” da classe média.
Nesse texto, usarei o termo que designa o supracitado grupo social ciente da dificuldade de definir o que ele representa. Durante algum tempo, influenciados pela ideologia marxista, intelectuais atacavam a classe média por sua estagnação. Ela seria composta por aqueles que não detêm os meios de produção, mas que, tampouco, constituem o proletariado, explorado em demasia pelo capital. Sua situação é cômoda, sem tomar partido na luta de classes. Sua meta é não empobrecer.A realidade, divertir-se com os luxos que consegue adquirir, cientes que dificilmente ascenderá à “primeira classe”. Ou seja, a classe média é uma enormidade, onde está você, eu, nosso médico, nossos professores... e por aí vai.
E as marchas pela legalização da cannabis sativa, as mobilizações nas redes sociais e mesmo as personalidades que levantam essa bandeira, entregam o jogo: se não for por questões que dizem respeito ao seu umbigo, a classe média não se mobiliza. E isso vale tanto para aquela juventude que evocou o preconceito aos nordestinos na vitória da Dilma no último pleito eleitoral, quanto aos “alternativos” de que tratamos aqui. Pois o discurso para legalizar a maconha é bonito, clama pelas liberdades individuais, sempre tão sacrificadas em uma sociedade com leis. Atacam as forças conservadoras, a polícia e a incompetência governamental (sempre eles!). Tudo para poder ascender o seu baseado, numa boa, na tranqüilidade.
Ok, não refuto os argumentos. Sempre defenderei o direito das pessoas fazerem consigo o que quiserem, contanto que não prejudiquem terceiros. Entretanto, acredito que a relevância dessa discussão deve ser relativizada. No que tange às drogas, me parece bem mais urgente discutir o avanço desenfreado do crack em território nacional. Mesmo as cidades mais isoladas têm sofrido com esse tóxico que, embora eclético, arrebanha nas classes populares sua legião de viciados. Pessoas que, de tão pouco ter, encontram no crack, em suprir sua necessidade dele, uma razão para existir. Em instantes, eles vêem sua humanidade alienada na soberana vontade de usar a droga. Para cada Charlie Sheen se drogando para farrear com suas três namoradas atrizes pornôs, são milhares os anônimos em alguma cracolândia, cujo prazer se limita a mínimos cinco minutos.
Houve um tempo em que aqueles que militavam pela maconha queriam mudar costumes, salvar a sociedade de suas prisões crônicas. Eles queriam tirar seus concidadãos de uma rotina de sofá e televisão/ trabalho. Hoje, eles é que são esses últimos. Só que, em vez de sofá e televisão, agora estão na cadeira do computador e com seus tablets no bolso.
Lutar pela legalização da maconha é uma questão de umbigo. A classe média gosta de cuidar do dela.

domingo, 13 de março de 2011

A Copa das pernas tortas

Dizia-se dos dribles de Garrincha que eles rompiam com a simples racionalidade. O marcador sabia que ele tentaria driblá-lo, para qual lado o jogador das pernas tortas sairia com a bola e, mesmo assim, não conseguia desarmá-lo. Era previsível e, mesmo assim, inevitável.

Quando foi anunciado que o Brasil seria a sede da Copa do Mundo de 2014, deu-se algo semelhante. Todos sabíamos das atrocidades com dinheiro público que seriam feitas, dos atrasos, das manobras políticas... e, mesmo assim, parece que a única coisa a se fazer é segurar um cartaz escrito “Eu já sabia”. Pois, há pouco mais de três anos do evento, o quadro pessimista vai se desenhando tal qual imaginado.

É legítimo o Brasil receber o maior evento futebolístico. O país é a maior potência do esporte, a população tem devoção por ele e a seleção brasileira é, certamente, uma das maiores instituições esportivas. Nossa posição de “paraíso turístico” também reforça o interesse do enorme evento em acontecer por aqui.

Entretanto, há a questão ética de nossa política. Temos um problema cultural, a incapacidade dos políticos em separar o público do privado. As múmias de terno que elegemos, por menos mal intencionadas que estejam, não demoram a ceder à tentação de buscar um enriquecimento maior do que o salário e os benefícios que recebem permitem. O que já não é pouco. E isso já tem mais de sete décadas que Sérgio Buarque de Hollanda teorizou e, desde então, inúmeras as releituras que se fazem acerca do patrimonialismo no Brasil. Porém, a reação aos escândalos de corrupção, em geral, continua a mesma: revolta, mas logo sufocada pela apatia.

Infelizmente, eventos como a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016 são prato cheio para políticos, empreiteiros, multinacionais e uma porção de outros interessados na farra do dinheiro público. E, a despeito disso tudo, sabemos que a outra festa, a oficial, será bonita, vai encher os olhos dos gringos e dos ufanistas. O custo, porém, nem todos vão ver. O país pode até lucrar com uma melhor estruturação de algumas capitais. Mas ainda será um enorme montante de dinheiro do qual nenhum centavo será aplicado em mudanças sociais.

E quando você estiver assistindo a abertura da Copa, com show da Ivete Sangalo ou coisa do tipo, tente lembrar da vista grossa que as políticas públicas e a sociedade têm para com milhões de desclassificados que perambulam, invisíveis, por todo o país. Lembre da educação estatal, das cidades com esgoto a céu aberto, das populações indígenas sendo expulsas de suas terras já limitadas,d a lentidão judiciária, dos altos e mal aplicados impostos... Lembre de como tudo isso que eu digo aqui é manjado. Só que, como um drible do Garrincha, apesar da previsibilidade, nós ainda somos enganados. Inevitavelmente.